Kriolu é Txeu

Kriolu é Txeu

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Os caminhos da independência da língua cabo-verdiana[1]

Dulce Pereira (Universidade de Lisboa; CELGA/ILTEC)


Embora haja um dia para a determinar e assinalar, não é num dia que se faz a independência de um país, muito menos a de uma língua. Por isso, quando se comemora a Independência da República de Cabo Verde, cabe perguntar: quantos anos tem a independência da língua crioula?


A independência linguística

A independência de uma língua, como o cabo-verdiano, mede-se por três indicadores, intimamente ligados: vitalidade, identidade e desenvolvimento. Falar a língua, falar (bem) dela e lutar por ela…

O primeiro garante da independência de uma língua é o seu uso pleno, no maior número de funções e de contextos, na oralidade e na escrita. E, para tal, é preciso que haja liberdade, vontade e condições (oportunidade e necessidade) de uso. E falantes…

O segundo aspeto determinante é o conjunto de representações e atitudes sobre a língua que, sendo negativas, inibem o seu uso e a podem levar à morte, sobretudo em situações de contacto com outra língua de maior prestígio e poder político ou social, por assimilação ou “troca” de língua. Pelo contrário, as atitudes positivas, além de fortalecerem a sua vitalidade, favorecem a curiosidade, o desejo de aprendizagem e uma metalinguagem também ela positiva, capaz de olhar para o seu objeto como entidade autónoma, específica, mas com as mesmas potencialidades de qualquer outra língua. Do mesmo modo, são o ponto de partida para o terceiro passo: o desenvolvimento.

Uma vez abertamente prestigiada, é à comunidade, como um todo, e através dos seus representantes, que cumpre lutar por ela. Atribuindo-lhe um estatuto claro, no sistema ecolinguístico a que pertence, definindo políticas de língua conformes a esse estatuto e implementando planos de concretização dessas políticas. Investigar, instrumentalizar, educar e ensinar são algumas das palavras-chave. Lutar pela vida da própria língua.

Instrumentalizar pressupõe, nomeadamente, criar um sistema de escrita [2], que beneficie dos resultados da investigação, e abrir e fomentar espaços de uso da língua oral e escrita, como os meios tradicionais de comunicação de massas, a web, os contextos oficiais, os serviços públicos e a literatura em diferentes géneros. Educar para a generalização de atitudes e comportamentos linguísticos positivos em relação a todas as línguas e aos seus falantes e ensinar a língua nas suas diferentes dimensões é também crucial para o seu desenvolvimento e, em última instância, para a sua independência.  

Glosando Pestalozzi, para quem “professor que não avança recua”, também as línguas que não avançam recuam. As ideias do senso comum de que basta falar uma língua para a saber falar e de que saber falar uma língua é para sempre, não sendo necessário investir na sua prática e no seu desenvolvimento [3], além de erróneas, impedem os avanços que garantem o não recuo.


Vitalidade da língua cabo-verdiana

No contexto mundial, e também no contexto africano, muitos são os casos de insucesso linguístico, como se pode ver pelos dados retirados do Ethnologue, no ano dos 40 anos da Independência de Cabo Verde (Lewis & al., 2015) [4], relativos ao número de línguas em perigo ou em extinção (v. Quadro 1):

Nº de falantesNº total de línguas vivasLínguas em perigoLínguas em extinção
Mundo7,106,865,2547,1021,531916
África1,101,542,5002,138245131
Quadro 1: Línguas em perigo ou em extinção

Em contrapartida, em Cabo Verde, no mesmo ano, a grande maioria da população residente que, segundo dados do Banco Mundial [5], era de 520,500 habitantes, fala o cabo-verdiano como língua materna, apesar de a língua oficial e de ensino ser o português. O crioulo é ainda usado entre os emigrantes e seus descendentes, na diáspora, para além de ser língua veicular de muitos dos cerca de 20,000 imigrantes, no arquipélago, como o prova um estudo da Direcção Geral de Imigração (Barros & Furtado, 2014), em que 69% dos 821 inquiridos referiram recorrer quotidianamente ao cabo-verdiano, tanto nas situações informais como nas formais.  

Esta é a prova maior de um percurso de resistência que, contrariando as previsões teóricas de contacto entre línguas de prestígio desigual, impediu a diluição do cabo-verdiano, apesar da constante pressão do português, desde as suas origens e, de forma declarada, até à Independência. Num percurso de raízes muito antigas cujos contornos ainda hoje se manifestam, contra as regras, ou apesar da sua ausência, marcados pela força mais ou menos ingénua da espontaneidade, o cabo-verdiano foi-se ─ vai-se ─  espraiando e ocupando, à sua maneira, os espaços deixados livres pelos decisores políticos.

É assim que, para lá das normalizações, sem aprendizagem formal, os falantes não deixaram de usar a sua língua, invadindo, desde muito cedo, os próprios domínios da escrita. Vejam-se dois testemunhos desse caminho de independência, na voz de duas mulheres, à distância de muito mais de um século, o primeiro, uma “carta de uma mulher a seu marido embarcado no baleeiro” (Botelho da Costa e Custódio Duarte, 1884), o segundo, uma mensagem de SMS, lembrando o dia da criança, em 2011 [6]:

Dento da minha peto in ten tanto sodade d’el cuma canto folja tibe n’un albre,      
sodade é ambre é tambre é doce é sucre é mel. Ma pacencia só cu boca terá fim.

Bu ta lembra qes tempus ki bu ta tinha nariz so ranhu. Ki hora kes ta flaba moh    
tinha nariz sujo bu ta limpaba ku costa mon. Ki bu ta baba russo pa skola         
pamodi nakel tempu bu ka konxia nivea! Kes bedjus tempus era sabi oh nau!?        
Filiz Dia di criança pa bo LoooL… 

Pela sua marginalidade em relação aos meios literários e científicos, eles próprios profícuos em poesia, prosa e ensaística crioula [7], estes testemunhos representam bem uma corrente de escrita de grande vitalidade que vem de longe e desemboca hoje, com enorme pujança, nas redes informáticas [8].

Outros testemunhos do nível avançado de segurança linguística dos falantes cabo-verdianos são as incursões na aventura da tradução de textos de outras línguas e a capacidade descomplexada de translanguaging[9], em sentido lato,não só entre o crioulo e o português, no caso dos bilingues, mas também entre variedades do crioulo.

Citemos, entre tantas, a conhecida tradução de duas estrofes de Os Lusíadas (Canto 5.º), pelo Cónego A. da Costa Teixeira (1898), de Santo Antão, de que aqui se transcreve um pequeno excerto:

Depôs que nô passá quês îa Canária,
Q’otr’óra ês dá nôme de Furt’náde,     
Nó’ntrá tá navegá lá pa quês ága
[…]
Nòs antrá na pôrte d’un d’aquês îa,
Q’tmá nôme d’aquêll guerrente’Sam Thiágue,
[…].

Ou, mais perto de nós, a tradução, por Manuel da Luz Gonçalves (1999), do Linguistic Creed (Credo Linguístico) de Benjamin Elson (1987):

Kredu Linguístiku

Nu ta kardita ma lingua é un di kes valor más inpurtanti ki Nhor Dés dja da ómi dja.
[…]
É bon ki tudu lingua prezervadu na fórma skritu através di gramátika, disionáriu y testu skrebedu. 
Es li é tarefa di nos fépu pa salvaguarda eransa di rasa umanu. […]. [10]

Exemplo da liberdade de translanguaging é também este pequeno excerto da transcrição de uma estória tradicional, a Stória di tres irmon ( Silva, 2004):

Ami, N staba própri inkantádu ku kel lugar, kel lugar xeiu di spedju, di floris,        
perfumi pa tudu ladu! Era mésmu kuza sábi, sábi, sábi! […] 
Kuándu N korda, N fla: 
“A nha genti!…Paxénxa! Não passa de sonho!” [11]

Ou esta afirmação de Brito Semedo, no seu blogue Esquina do Tempo [12]:

Di prósima bez N ta tenta skrebe na kriolu di Praia. Mi e meiu badiu, meiu sanpadjudo y, pur isu, mi e bi-varianti.

A independência do cabo-verdiano tem, pois, como uma das suas bases, a liberdade: o exercício da mais íntima liberdade de expressão de cada falante, na sua ou nas suas línguas ou variedades.

Considerando como válidos os seguintes itens que compõem o índice de vitalidade das línguas (Quadro 2) definido pelo Grupo especial de peritos da UNESCO (2003), para as línguas em perigo,

Transmissão de uma geração para outra.
Número absoluto de falantes.
Percentagem de falantes no conjunto da população.
Reação face aos novos domínios e meios de comunicação de massas.
Utilização da língua nos diferentes domínios públicos e privados.
Existência de materiais de aprendizagem e ensino da língua
Quadro 2: Índice de vitalidade das línguas

vemos que são em particular os dois últimos que merecem reparo e a especial atenção dos políticos, implicando o apoio ao desenvolvimento, como adiante focaremos.


O Caminho da Identidade

L’identité est donc une affaire complexe, […], l’affaire de soi à travers le regard des autres.

Chareaudeau, 2009

“Identity” refers to the way we conceive ourselves as individuals or as members of groups – or, indeed, the way others perceive and categorize us.

Edwards, 2012

Sobre o caminho para a construção de uma identidade linguística positiva, na comunidade, e consequente reforço da vitalidade e da independência da língua cabo-verdiana, muito haveria a referir. Porque o desenvolvimento da consciência e das atitudes linguísticas, de cada um dos falantes e dos outros, é um processo muito lento, complexo e por vezes contraditório, em que frequentemente o dizer não corresponde ao sentir, muito menos ao fazer.

Para que serve a nossa língua? Quanto vale a nossa língua, para nós e para os outros? E em comparação com outras línguas? Em que contextos é que pode ou não ser usada? Qual o valor que os outros lhe dão? Eis algumas perguntas que permitem identificar as atitudes sobre a língua e o maior ou menor desfasamento entre o valor que lhe atribuímos, por um lado, intimamente, por outro, publicamente (reflexo da nossa (in)segurança linguística).

Se entendermos que a língua pode ser usada autonomamente e sem restrições[13], em todos os contextos e modalidades, com a mesma funcionalidade que qualquer outra e que o seu valor deve ser reconhecido por todos, então a nossa identificação com ela é positiva. Uma língua conquista a sua independência quando a maioria dos seus falantes com ela se identifica positivamente e quando, ao mesmo tempo, a comunidade garante as condições do seu uso pleno, sem impedir o das línguas que com ela estão em contacto.

Se a independência política trouxe definitivamente para o espaço público o discurso de valorização e represtígio do crioulo (de que o 1º Colóquio sobre a Problemática do Estudo e da Utilização do Crioulo, em Abril de 1979, no Mindelo, foi um dos primeiros sinais (Veiga, 2000)), foi preciso muito tempo até um primeiro ministro[14] assumir a sua língua materna num organismo internacional como a ONU e algum tempo mais será preciso para a total desierarquização e para a construção da igualdade, subjetiva e objetiva, entre o cabo-verdiano, o português e todas as outras línguas que com ele convivem em Cabo Verde, como a língua gestual, com aproximadamente 1500 falantes (Ethnologue, 2015), e as línguas dos imigrantes (cerca de 4% da população residente, em 2015), nomeadamente as línguas africanas da Guiné-Bissau, do Senegal, da Guiné Conacri e da Nigéria [15].

É assim que, por exemplo, como escreve o jornalista Carlos Santos, no seu blogue Kriol Rádio (O Uso do Crioulo nas Emissões de Rádio, out. de 2011),

Embora não exista nenhuma norma escrita ou implícita que proíba o jornalista – em situação formal de comunicação – de usar o crioulo nos seus trabalhos jornalísticos, o que brigaria com o espírito da Constituição da República,[16] existe quase que um consenso em como a comunicação em antena faz-se em português. Na frente informativa, existe em toda a grelha da programação da RCV [Rádio de Cabo Verde] um único espaço noticioso escrito   e lido em kabuverdianu. […] Na imprensa escrita e nas televisões domina, [pura] e simplesmente, o português.[17]

Por outro lado, num inquérito realizado em 2004, junto de 100 professores de português, sobre as suas atitudes perante a língua materna, 95 dos inquiridos consideram que o crioulo deve ser oficializado, 90 que, “apesar das dificuldades do país, o governo deve investir na formação de professores e na produção de materiais didáticos para o ensino da língua cabo-verdiana” e 76 que o ensino pode melhorar com a introdução do cabo-verdiano nas escolas, a par da língua portuguesa (Sanches, 2005: 95).

Mas, embora sinuoso, o caminho vem de longe e longe vai o tempo em que o crioulo era considerado um idioma dissonante, repleto de exclamações guturais e de dissílabos, sem gramática, que, dada a sua pobreza, não podia traduzir nem permitir senão imperfeitamente as associações de ideias abstratas.[18] Porque também vem de longe a voz dos que primeiro se levantaram a defendê-lo, como Adolfo Coelho, que em 1880 respondia assim às dúvidas de Joaquim da Silva Caetano sobre a viabilidade do seu estudo gramatical:

Exprimo aqui o desejo de que o nosso digno consócio de S. Nicolau nos envie      alguns textos desse crioulo, onde talvez se descubram as regras gramaticais que ele lá não encontra.

Coelho, 1880

Da conceção de dialeto, dependente, à de língua, independente, com as suas variedades próprias, foi um passo de gigante que determinou, entre outras coisas, que o estudo da gramática do cabo-verdiano não se fizesse pela lente da análise das línguas românicas ou que, nos vocabulários e dicionários, não lhe fosse reservada apenas a margem direita, em contraposição ao português.

Outro grande passo para a independência da língua crioula e que foi sendo dado de forma mais ou menos espontânea, como vimos, mesmo antes das diferentes propostas de grafia (1979, 1989, 1998)[19], da oficialização de um alfabeto (em março de 2009) [20] e de um vocabulário normalizado ainda por elaborar, foi a compreensão de que não estava destinada a ser mera língua de oralidade, sendo a própria recolha e transcrição da chamada literatura oral[21] um importante marco para a construção, ainda em curso, de uma gramática textual menos dependente dos modelos e do vocabulário da língua portuguesa (Pereira 2002, 2011a).

Afinal, na sabedoria que é de todos, a língua diz de si o que deve ser dito: Kriolu é txeu[22]. E, por isso, cabe à comunidade explorar e desenvolver todas as dimensões dessa abundância que é a matéria prima da sua identidade. Mesmo no ensino.


Desenvolvimento

Language development is the result of the series of on-going planned actions that language communities take to ensure that they can effectively use their languages to achieve their social, cultural, political, economic, and spiritual goals

Lewis, Simons & Fennig (2015)

Só com a Independência de Cabo Verde foi possível dar um primeiro salto qualitativo: incluir o crioulo como objeto de uma política e de uma planificação linguísticas orientadas para o seu desenvolvimento, e consigná-lo na própria Constituição.[23] O grande objetivo do discurso oficial foi sempre enquadrar e incentivar, pela definição de princípios orientadores e de metas, ou legitimar, pelas leis, os caminhos da afirmação do crioulo e da sua expansão em todos os contextos, a par do português, nomeadamente nos meios de comunicação de massas, nos organismos públicos e no ensino.  

Para além da atribuição do estatuto de língua de unidade e identidade nacional, garante da expressão e da preservação da diversidade cultural, começaram a construir-se, com os avanços e recuos próprios de uma nação jovem, as bases para a sua oficialização, seguindo por três vias paralelas mas mutuamente influenciáveis que se espera venham a confluir um dia no bilinguismo (ou plurilinguismo) funcional desde sempre almejado e politicamente “assumido” em 2001[24]: as vias da legislação e das resoluções oficiais, que incluíam, nomeadamente, a introdução progressiva do cabo-verdiano como língua de ensino (v.BO nº10, resolução 08/98); da investigação, em especial  no ensino superior,[25] com vista à normalização e instrumentalização da língua; e da experimentação, não só no arquipélago, mas também na diáspora.

Esse discurso ganha novos contornos a partir de 2006, num segundo salto qualitativo, que abre as fronteiras do bilinguismo ao multilinguismo, acompanhando a “globalização” e os movimentos internacionais em favor do plurilinguismo individual.

É assim que o Programa do Governo para a VII legislatura, 2006-2011, fala da necessidade de promover “uma sólida base em línguas” e que, em 2012, se cria a Comissão Nacional para as Línguas, incluindo, expressamente, a língua gestual de Cabo Verde. Desdramatiza-se, deste modo, a tradicional relação umbilical exclusivista entre cabo-verdiano e português, dando ao crioulo um estatuto de maioridade, ao lado das outras línguas.

Se compararmos os fatores que, segundo o Ethnologue, 2015constituem o índice de desenvolvimento de uma língua (Quadro 3), com os que definem o seu índice de vitalidade, e que acima foram referidos (Quadro 2),

Sistemas de escrita em uso, tanto atualmente como historicamente
Taxas de alfabetização na língua, bem como nas línguas dominantes na região
Existência de vários tipos de literatura, incluindo poesia, histórias, materiais traduzidos (nomeadamente, documentos sobre saúde e desenvolvimento e a Bíblia), e outros materiais impressos, como jornais e revistas.
Uso da língua nos meios de radiodifusão (rádio, televisão, materiais gravados em CD, cassetes, discos de vídeo digitais, etc.), ou em filmes e vídeos.
Uso da língua nos “novos media“, como em páginas da web, em salas de chatpodcasts e downloads the MP3, e em SMS.
Uso da língua pelo governo
Uso da língua por outros, como segunda língua/ língua segunda
Quadro 3:  Índices de desenvolvimento das línguas (Ethnologue, 2015)

vemos que os pontos fracos, no caso do cabo-verdiano, decorrem, em ambos os casos, da falta de um ensino generalizado, a começar pela alfabetização, que exige materiais didáticos e um sistema de escrita regularizado. 

Esse é o caminho. Um caminho que já começou, não só a montante, pelas vias da legislação e da investigação, mas sobretudo, na prática, pela via da experimentação.


Li sima la, lá como cá

Na sequência das recomendações internacionais, em particular da UNESCO, em favor do direito à alfabetização na língua materna (v., por exemplo, a IV Conferência Internacional de Educação de Adultos, 1985) e com o incentivo e o apoio da Cooperação Suíça, Cabo Verde aceitou, em 1987, através da Direção Geral de Educação Extra-Escolar, embarcar numa experiência pioneira de alfabetização de adultos em crioulo[26]. Já nessa altura, porém, se compreendeu que não era possível, em nome desse direito, desperdiçar a riqueza do bilinguismo, proporcionada pela histórica presença do português, língua de maior projeção internacional. Foi assim que, até finais de 1992, inicialmente em Santiago e mais tarde também em S. Vicente, em vários círculos de cultura se introduziu a aprendizagem da leitura e da escrita, primeiro em cabo-verdiano e depois em português, passando por uma fase de desenvolvimento da oralidade nesta língua.

Esta iniciativa governamental teve ainda o mérito de estimular a imprescindível produção de materiais didáticos construídos numa perspetiva bilingue, isto é, favorecendo e potenciando as transferências positivas entre as duas línguas,[27] o que obrigou à elaboração, para além dos manuais, de gramáticas e de vocabulários e à indispensável regularização prévia da escrita do cabo-verdiano, contribuindo assim, de forma indireta, para o seu desenvolvimento (Pereira, 1989 a)

Num Cabo Verde rural, em que as notícias da rádio, em português, eram escutadas coletivamente e traduzidas pelos alfabetizadores, para melhor compreensão dos seus alfabetizandos, estas experiências mostraram, pelo êxito dos resultados, a bondade dos pressupostos, confirmando as vantagens da aprendizagem nas línguas maternas.

Na verdade, após quatro meses de alfabetização em crioulo e dois meses de exercício da oralidade em língua portuguesa, os alfabetizandos, inconscientes de que só se alfabetiza uma vez, e dado que a grafia que fora adotada (Pereira, 1989 b) minimizava propositadamente o esforço de passagem de uma língua a outra, manifestavam sistematicamente o seu espanto por “afinal ser mais fácil ler português”…

Não estarão, pois, longe da verdade os professores que, com a sua experiência, preveem uma melhoria do ensino e da própria aprendizagem da língua portuguesa, com a aprendizagem do cabo-verdiano. Porque a realidade e a sua avaliação o vêm confirmar, neste como noutros contextos.

Há um ditado que diz que Deus escreve direito por linhas tortas. Tortas, talvez, foram as linhas que introduziram o crioulo na educação, em Cabo Verde, pela margem do sistema, entre aqueles que, pela idade, em muitos casos, dele já estavam excluídos. Tortas, mas direitas, também, chegaram a Portugal, onde em 1998, ainda pelas margens, passaram por dois jardins de infância que, em parceria com a Dinamarca e o Reino Unido, acolheram um projeto de educação bilingue (Pereira, 2006)[28].

Subterrâneas, emergiram mais tarde (entre 2008 e 2012) num novo projeto, esse agora no 1º ciclo do ensino básico oficial, convocando para a aprendizagem do crioulo (e em crioulo), a par do português, nos quatro primeiros anos de escolaridade, crianças não só de origem crioula, mas também de origem portuguesa, de um bairro ao Sul do Tejo, o Vale da Amoreira, com uma longa tradição de imigração: o projeto Turma Bilingue (português/cabo-verdiano), promovido e desenvolvido pelo ILTEC[29] e financiado e apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, de que fui coordenadora.[30]

Embora, de acordo com a investigação de casos afins, a nível internacional, os efeitos positivos da educação bilingue só se façam sentir plenamente no sexto ano de escolaridade, não foi preciso esperar muito para que eles fossem bem visíveis nas produções dos alunos, em ambas as línguas.

Tomemos como exemplo dois textos escritos, o primeiro em cabo-verdiano e o segundo em português, por um menino de origem cabo-verdiana, logo no segundo ano de escolaridade, pouco tempo depois de ser alfabetizado, numa situação de teste em que lhe foi proposto que contasse a história da seguinte banda desenhada:

Comparemos o segundo texto, em português, com este outro, produzido por um aluno cabo-verdiano, também em situação de teste, à entrada para a Universidade de Lisboa, com uma história de 12 anos de ensino monolingue, em Cabo Verde:

Eu comecei falar Portugues só apartir de oito anos porque tenho dificuldade em certo vocabulario e tambem em escrever correcto. O Português é a minha segunda língua por isso encontrei algumas dificuldade quando chegava a Portugal. Quando comecei a assistir as aulas na universidade senti algumas dificuldade de compreender alguns vocabulário que o professor introduze. [31]

Basta analisar (para referir apenas o que é mais simples) o modo como ambos aplicam as regras de uso do singular e do plural e fazem as concordâncias, para compreender como a realidade se impõe e vem ao encontro das perspetivas teóricas. Uma realidade que abrange e beneficia as próprias crianças de origem portuguesa, capazes, ao fim de escassos dois anos de contacto com o crioulo e a sua escrita[32], de produzir textos como este, sobre a mesma banda desenhada[33]:

Botas di mar

Era un bes dos mininu ki era irmon. Es dos mininu sata piska pexi
Es dos mininu txoma Djon ku Manel.
Djon flá pa mar: – mar, ami kre un pexi, i mar responde  non ami bai dar un bota.
Kantu Djon bai péska pexi, el péska un bota e si manu ri.
Manel konsegi péska pexi e Djon fika odja pa el.
Depos Djon panha otu bota i gosi e tenba dos bota ki é un par di botas.
Djon sta ku bota na pé. Manel fika ku inveja di Djon i Djon gradesi a mar.

Esta deslocação gradual das margens para o centro (no ensino oficial) só pecou por se confinar à dimensão experimental, própria dos projetos, limitada no tempo e no espaço. Foi uma experiência, no entanto, em que, acompanhando os quatro anos de educação e ensino bilingues, se fez investigação, para comprovar a veracidade das suas vantagens, que a teoria e a prática noutros países previam (Collier e Thomas, 2004; Wright, Boun e Garcia, 2015; Ouane e Glanz. 2010;  Siegel, 2010).

Assim se provou, na análise longitudinal das atitudes e dos comportamentos linguísticos, da consciência linguística implícita e explícita, do grau de proficiência oral e escrita nas duas línguas e dos resultados escolares nas diferentes disciplinas, que as crianças abrangidas pelo novo modelo tinham melhores prestações, em quase todos os parâmetros, que as de outra turma com as mesmas características, da mesma escola, que seguia o modelo monolingue tradicional e que serviu, no estudo, como turma de controlo (Pereira, 2011b, 2014; Pereira, Martins e Antunes, 2012).

Em menos de um ano, as linhas tortas seguiram o seu caminho e voltaram às origens, cada vez mais pesadas de experiência e mais leves de incertezas. Em 2013, deu-se início a um movimento afim de educação bilingue, em Cabo Verde,[34] que, nos finais de 2015,  já abarcava oito turmas, também no 1º ciclo de escolaridade. Oito turmas de crianças felizes por não terem de abandonar a sua língua materna no momento de entrarem na tera lonji que é o mundo da escola e da literacia.

Segundo Neidina Moniz[35], “os alunos que iniciaram a experiência [Ponta d’Água e Flamengos, em 2013/14], estão neste momento [2016] no 3º ano e não houve nenhuma reprovação no 2º ano, ano de escolaridade em que normalmente  se verificam altas taxas de reprovação”. O mesmo aconteceu com as duas turmas do Tarrafal (Ex-EBC e Cabeça Carreira) que iniciaram a experiência no ano letivo seguinte (2014/2015)  (v. Quadro 3).

Quadro 3: Taxa de sucesso das Turmas Bilingues

Linhas tortas, linhas direitas…


O espelho

As independências não negam as dependências, antes as aproveitam em favor da construção da igualdade e da liberdade de todos. Assim a independência do crioulo cabo-verdiano, que só a terá segura enquanto lutar pela igualdade de todas as línguas da sua comunidade e dos seus falantes. Igualdade nas leis, sim, mas também no valor e no uso em todas as modalidades e em todos os contextos, o que implica o desenvolvimento de idênticas capacidades de representação dos mundos de referência, reais ou fictícios, de expressão do pensamento e de comunicação com os outros.

Um caminho em construção que tem de mobilizar ativamente e de forma concertada os decisores políticos, os investigadores e os educadores, sempre em favor dos falantes e não contra eles. Porque não há línguas sem falantes, sejam-no eles desde a infância ou em fases mais avançadas da vida: como vimos (Quadro 2),  um dos índices definidores do desenvolvimento de uma língua é o seu  “uso […] por outros, como segunda língua ou língua segunda”.

Nada como as crianças, esses pequenos linguistas, no dizer de W. Labov, e também professores, diria,para nos ensinarem os caminhos da independência, na inocência das suas decisões.

No Vale da Amoreira, os meninos de origem portuguesa quando entraram na escola, em setembro de 2008 – nessa altura (mas só nessa altura) os outros – , com os seus escassos cinco, seis anos, nunca tinham ouvido falar do crioulo cabo-verdiano. Não questionaram, porém, nem por uma só vez, a sua aprendizagem. E não seria a escola para aprender? E não seriam as línguas para falar?

Em 2009, menos de um ano depois, durante um inquérito feito pelos investigadores, um desses meninos, o Eduardo, respondia assim:

P. Costumam conversar em casa?
R.  Sim.

P. Quem conversa mais contigo?
R. O meu mano.

P. Que língua usam?
R. Português e Crioulo.

P. Como?
R. Eu ensino-lhe Crioulo.

No mesmo ano, a mãe da Inês, de origem portuguesa e angolana, orgulhosa do recente bilinguismo da filha, relatava:

Ela quer falar crioulo mas ninguém sabe, lá em casa.
Então, põe-se a falar crioulo ao espelho.

Este será o espelho da independência do cabo-verdiano.


Referências

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[1] Comunicação apresentada à Conferência Internacional, organizada pela Associação Cabo-Verdiana de Lisboa, no âmbito das comemorações dos 40 anos da Independência da República de Cabo Verde, Cabo Verde: Vicissitudes e Desafios de uma Nação Crioula Soberana e de um Pequeno Estado Soberano Pós-ColonialLisboa, Reitoria da UL, 12 de Dez. de 2015.

[2] Não apenas um alfabeto, mas também um vocabulário ortográfico.

[3] Os fenómenos de erosão ou perda linguística são bem documentados e descritos pela psicolinguística, mesmo quando se trata de uma língua materna (v. Selinger, 1996, nomeadamente).

[4] V. ethnologue.com

[5] V. worldbank.org

[6] Mantém-se a escrita original.

[7] Que aqui se tornaria impossível referir, na sua extensão.

[8] Segundo o jornalista Carlos Santos,  em 2011, no blogue Kriol Rádio,  as TIC têm vindo a constituir-se numa potente ferramenta para a disseminação da grafia do crioulo. Basta ver que a comunicação online no Twiter, no Facebook, assim como os SMS e os chats na internet faz-se em crioulo. Acessível on-line em kriolradio.blogspot.pt.

[9] Ofelia García (2009:140) define translanguaging, como “act performed by bilinguals of accessing different linguistic features or various modes of what are described as autonomous languages, in order to maximize communicative potential”.

[10] No original inglês, We believe that language is one of God’s most important gifts to man […].

All languages are worthy of preservation in written form by means of grammars, dictionaries, and written texts. This should be done as part of the heritage of the human race. […].

[11] Sublinhado meu.

[12] Em 22 de fev. de 2010. Em  brito-semedo.blogs.sapo.cv

[13] Que não sejam as da comunicação efetiva com falantes que não a dominem.

[14] José Maria das Neves, 22 de setembro de 2011, na 66ª Assembleia Geral das Nações Unidas, justifica:

 N disidi komunika na Kriolu Kabuverdianu pamodi el é língua, é kultura, é stória y é memória. […] N ta fase-l ku konvikison ma Kriolidadi é un valor antropolójiku di tudu Umanidadi y N ta fase-l inda pa distaka na el nos Kabuverdianidadi, nos alma, nos manera di ser, nos ethos y nos pathos kabuverdianu,  […].

‘Decidi comunicar em Crioulo Cabo-Verdiano, porque é língua, é cultura, é história, é memória. […]. Faço-o com a convicção de que a crioulidade é um valor antropológico de toda a Humanidade e também para nele destacar a nossa cabo-verdianidade, a nossa alma, a nossa maneira de ser, o nosso ethos, o nosso pathos cabo-verdiano’.

[15]  Segundo dados do INE (2015, 41), os países de nascimento com maior representação de imigrantes, em Cabo Verde, em 2014, são, por ordem decrescente, S. Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Angola, Portugal, Senegal, França, Itália, Estados Unidos, Índia, Nigéria, Espanha, China, Brasil, e Guiné Conacri.

[16]  A lei da radiodifusão obriga, pelo contrário, à emissão “de programas regulares vocacionados para a difusão da língua e cultura cabo-verdianas” (Lei nº 71 /VII/2010).

[17] Acessível em kriolradio.blogspot.pt

[18] V. Monografia Catálogo da Exposição de Cabo Verde, publicada pela Sociedade de Geografia de Lisboa, por altura da Exposição Colonial portuguesa, em 1934.

[19] As duas primeiras propostas, respetivamente, por Manuel Veiga, na sequência do 1º Colóquio sobre a Problemática do Estudo e da Utilização do Crioulo, por mim própria (Pereira, 1989a), no Fórum de Alfabetização Bilingue de Adultos e a última consignada pelo decreto nº 67/98, de 31 de dez., que  aprovou, a título experimental, o ALUPEC (V. Grupo para a Padronização do Alfabeto, 2006).

[20]  Pelo decreto-lei 8/2009, que institui o Alfabétu Kabuverdianu (v. Silva, 2014).

[21] Em que tiveram um papel crucial Tomé Varela, Osvaldo Osório e Humberto Lima, nomeadamente.

[22] Que ouso traduzir como ‘o crioulo tem muito que se lhe diga’,  na sua riqueza e variação.

[23] Para uma cronologia relativamente detalhada, até 2012, ver o artigo de Manuel Veiga, um dos principais intervenientes no processo de afirmação do cabo-verdiano, pós-independência, Prusésu di Afirmason y Valorizason di Língua Kabuverdianu (1975-2012), Kronolojia di Asons y di Mididas di Pulítika. 6 di Marsu di 2012. Acessível em http://odjudagu.blogspot.pt/2012/03/prosesu-di-afirmason-y-valorizason-di.html. V. também Semedo e al. (2015).

[24] V. Programa do Governo, BO nº 6, 2 suplemento, 13 de março, 2001.

[25] Antes mesmo da Universidade de Cabo Verde, que acolheu, em 2010, o primeiro “Mestradu di Kriolístika y Língua Kabuverdianu”, já o Curso de Formação de Professores do Ensino Secundário (Instituto Superior de Educação, a partir de 1995) incluía, nos seus currículos, a cadeira de “Strutura di Kriolu”. O mesmo Instituto criou, em 2007, um Centro de Língua e de Cultura Cabo-verdianas.

[26] Projecto Experimental de Alfabetização Bilingue, que acompanhei, enquanto consultora,  investigadora e formadora na área da linguística cabo-verdiana e portuguesa, durante os 5 anos da sua duração. A equipa inicial era composta, ainda, por Marcela Ballara, Arminda Brito e Manuela Menezes.

[27] O que pressupôs, nomeadamente, a definição de um progressão gráfica, vocabular e gramatical, no processo de aprendizagem da leitura e da escrita, partindo do que lhes era comum para o que as diferenciava. Assim, por exemplo, a primeira palavra geradora (no sentido dado por Paulo Freire), muito significativa na cultura cabo-verdiana,  era a palavra lata, comum às duas línguas, também graficamente.

[28] Projeto Nursery Policy and Practice within a Bilingual Context (1998-2000), sob a égide do Secretariado Entreculturas,  no âmbito do Programa Sócrates — Comenius (Acção II) da Comissão das Comunidades Europeias, de que fui consultora e formadora. O Projecto envolveu dois jardins de infância (do Centro Social do Bairro 6 de Maio e do Centro Social S. Maximiliano Kolbe), localizados em bairros suburbanos da Grande Lisboa, escolhidos por acolherem um elevado número de crianças filhas de imigrantes, falantes de outras línguas maternas que não o português

[29]Instituto de Linguística Teórica e Computacional.

[30] V. http://www.iltec.pt/projectos/em_curso/TB.html.

[31] Mantém-se a grafia original.

[32] Apenas uma hora por dia, por constrangimentos  do Projeto.

[33] Mantém-se a grafia original.

[34] Levado, como projeto de investigação, pela mão da professora de cabo-verdiano cooptada pelo ILTEC para o projeto Turma Bilingue (Ana Josefa Cardoso), e adotado e posteriormente generalizado pelo Ministério da Educação de Cabo Verde.

[35] Técnica do Ministério da Educação envolvida na experiência e representante da Diretora Geral de Educação, em comunicação à Mesa redonda sobre Educação Bilingue e Plurilingue, no âmbito do Encontro anual da Associação de Crioulos de Base Lexical Portuguesa e Espanhola (ACBLPE), que teve lugar na Universidade de Cabo Verde, na Praia, em 23 de Junho de 2016.